Tuesday, June 12, 2007

- Preciso de espaço, desculpa.
Não há mais mãos em mãos, apertadas, nem mãos pelo cabelo, de mansinho. Tudo porque precisas de espaço, e eu sempre te fiz as vontades. Mas isso é o quê? Dois metros, eu do lado de cá da rua e tu do lado de lá? Vais mudar de cidade, mudo eu, ou chega-te que vá a tua casa buscar a camisola verde que lá deixei? Se forem só meia dúzia de centímetros não faz mal, consigo satisfazer-te o pedido, mais que isso não. E esse espaço é geográfico ou temporal? Ligo-te amanhã depois de almoço, para falarmos melhor, estou certa que reconsiderarás. Podemos ir lanchar ao sítio do costume, dividimos uma torrada como sempre, tu comentas que a empregada até tem uns olhos giros e eu belisco-te debaixo da mesa. Isso é uma desculpa qualquer, não me estás a dizer a verdade. Não queres dizer, não digas, mas então explica-me o que é isso do espaço. É como quando vamos no elevador com um vizinho e nos encostamos muito num canto? Ou no metro, como quando preferimos ficar no cais e esperar pelo próximo? Eu quero apanhar este e não me importo que vá apinhado, só me chateia que alguém te toque, mesmo sem querer. Mais ainda se eu não o puder fazer. Por isso se queres espaço, logicamente, não voltarás a andar de metro ou de autocarro, prefiro que não te aproximes de ninguém. Nem por carta, sequer. Assim terás o teu espaço, e só assim. Nisto não cedo. Perguntas-me se estou a enlouquecer. Dizes que vou ficar bem, e que o tempo tudo cura. Respondo-te que o relógio e o calendário só emendam o que por algum motivo estava enfermo, ainda ontem estávamos bem, pensei que hoje estávamos melhor que nunca. Mais valia teres virado a cara quando aqui cheguei, bem sabes como detesto pensar nas coisas que se revelam como as últimas. Se estamos a minutos do fim não é porque tens falta de espaço, é porque há demasiado entre nós. Sabes que mais? Dou-te razão. Hoje é sábado, mas na segunda, à hora de ponta, num transporte público qualquer, vou procurar alguém que se contente com o pedaço mais pequeno de chão, onde só cabe um pé em cima do outro, e vou fingir que é a primeira vez, como fiz contigo.

4 comments:

A.S. said...

Não se encontra o espaço, é sempre necessário construí-lo. Tarefa árdua se tiver sustentação em razões aparentes ou fundamentos imaginários...

JAS said...

É sempre de louvar uma mulher que escolhe o nome da Iron Lady como nickname. Os meus aplausos, minha cara.

Anonymous said...
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