Friday, June 8, 2007

Fui, como ervas, e não me arrancaram

Continuando com os temas fracturantes, que têm sido a força deste blog, hoje gostaria de falar dum assunto que é de uma relevância enorme para a sociedade portuguesa, com a agravante que é o facto da maior parte de nós não nos apercebermos da importância do mesmo, mas nada temam que eu fui chamado para alertar.
E o problema é a má interpretação que tem sido feita ao longo dos anos de um dos poemas do Fernando Pessoa que, indubitavelmente, resulta da dificuldade que os Silvas têm de perceber os paradoxos e ver mais do que fica dito. Agora que consegui a vossa atenção, resta-me explicar onde fui buscar esta ideia. Surgiu depois de ver na TV um senhor na ponte, parecido com o Bosingwa, a afirmar que o buzinão foi tanto física como ruidosamente perceptível pelo Ministro.
Não percebi. Continuo sem perceber. Achei melhor tentar esquecer. Mas, tal como as grandes paixões, continua lá para me azucrinar. O que é chato. Ou nem tanto assim. Dizem-nos que temos coração. Se calhar até é bom.
Bom, o facto é o de que esse homem não disse nenhum paradoxo, apenas uma parvoíce, mas deu-me a desinspiração para escrever crap e isso é que importa.
O poema é a Tabacaria e, erro meu, não é do Pessoa mas sim do Álvaro de Campos, um daqueles poemas que toda a gente sabe citar nas horas mortas mas ninguém percebe o significado. Um pouco como estar "in bloom" para os que atingiram o Nirvana.
A mim sempre me fez confusão um génio não se ver como tal. Era como se pusesse em causa a minha convicção de ser um deles e isso eu não poderia aceitar. Vai daí que sempre me intrigou o Álvaro dizer "Não sou nada/Não posso querer ser nada/Nunca serei nada" e a professora explicar que o sujeito poético (que terrível expressão!) revelava sentimentos de fracasso, melancolia e revolta consigo próprio. Ora é sabido que a revolta é o primeiro estado de consciência do Homem. E que o português é uma língua graciosamente traiçoeira. E que menos com menos dá mais (engraçado como a matemática ajuda na interpretação de poesia), logo "Não sou nada" significará que se é alguma coisa. E assim para os outros versos.
Mas não posso bastar-me com estes versos iniciais. Há que tocar mais fundo. O poeta começa então a revelar-se aos poucos "Falhei em tudo/Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada" o que é um indício. E acaba, não o poema, mas a revelação "Semiergo-me enérgico, convencido, humano/E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.". E já nada será como dantes.
Lendo assim já faz sentido o Universo reconstruir-se sem ideal nem esperança e o dono da Tabacaria sorrir. A Esperança só dá o braço aos infelizes. Os outros não precisam dela para nada. Se o Universo se reconstrói sem ela é porque algo de bom se conseguiu, nem que seja a, não tão mera assim, paz de espírito. O que cada um traz dentro de si é, na realidade, a única coisa que importa porque ninguém, a não ser o próprio, lho poderá tirar...o que parece irreal!
Um amigo uma vez disse-me que a Arte devia revelar a Arte e esconder o artista, parece-me que Pessoa também o sabia. Não te preocupes, ninguém liga, your secret is safe.
É curioso como tudo na vida só faz sentido na contradição, no paradoxo. Toda a gente sabe que o paradoxo é uma afirmação que implica uma contradição fundamental na sua base. Quase ninguém sabe que, na verdade, o paradoxo não comporta contradição alguma. Diz a verdade e por isso é que nos rimos.
Voltando ao poema, pensando bem, talvez não seja esse o seu significado, mas é que para alguns de nós faz toda a diferença do Mundo haver ou não uma rosa, consoante o apetite da ovelha (e que tenebroso é depender disso!). Talvez o meu amigo tenha estado mais acertado quando disse que o que a Arte espelha realmente é o espectador e não a vida, e seja eu que queira ver o poema desta forma. Talvez também eu tenha querido dizer algo de subtil e sublime neste texto. Já não sei. Estou baralhado. Ou como diria o mesmo amigo...às vezes sou tão inteligente que não percebo uma palavra do que digo.
Valete, Frates (apesar de ser sozinho).

10 comments:

Anonymous said...

"às vezes sou tão inteligente que não perecebo uma palavra do que digo."
brilhante.

K. said...

É fixe ter gente da família a ler o blog...

Anonymous said...

obrigado irmão!
Libertas.

Anonymous said...

eu penso nas coisas e faço aquilo que tudo o vento levou...e assim fiz.

K. said...

O que é que isso quer dizer? (Agradecíamos que as pessoas se identifiquem nem que seja com um nome falso, sim lá porque demos os verdadeiros não implica que vocês tenham de dar também)

Anonymous said...

paradoxo do paradoxo do paradoxo

MJC said...

ah... o paradoxo

K. said...

O paradoxo do paradoxo do paradoxo é puro nonsense.

el.sa said...

Olá! Encontrei este blog numa pesquisa pessoana a título de curiosidade pessoal e não pude deixar de atentar neste texto, sem dar os parabéns ao autor pela forma ardil com que captou a atenção e enredou o leitor numa explanação inteligente e bem humorada.
Sei que o post é antigo para quem o escreveu, mas aos meus olhos tem a graça de uma novidade. (Será isto um paradoxo? ;) )***

Anonymous said...

This is great info to know.